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sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Dentro de mim

Sempre tive medo de altura, de altura não, de cair.
Não gosto de chegar perto de janelas em andares altos, sempre tive a sensação de que meus óculos escorreriam pelo meu nariz e ao encontrar seu fim e se atirar nesse abismo eu me jogaria lá de cima pra resgatá-los.

Medo não tem sentido.

Eu tenho medo de escuro. As lembranças voltam ao tempo da infância, quando as luzes se apagavam vinha o medo de que no escuro eu não veria quando algum mau viesse me procurar. Já teorizei sobre isso, tenho claros na memória alguns pesadelos que me contam histórias reais de terror nas suas entrelinhas.

Medo tem forma.

Eu não gosto de ficar sozinho. Bom, eu não gostava. Na adolescencia eu comecei a entrar em pânico quando ficava só em casa. Carreguei por muito tempo essa aversão, se não houvesse mais ninguém em casa comigo eu ligava a tv, o som, o computador e telefonava pra alguém. Pedia por favor que conversassem comigo sobre o dia, inventassem uma estória, qualquer coisa que me fizesse focar em outra coisa se não o horror que me encontraria porque eu estava sozinho. Pânico. Minha cabeça pregava peças, meus olhos viam coisas, meus ouvidos escutavam o que não existia.

Medo é esmagador.

Essas travas as vezes me impedem de me ver como "normal", elas encontram abrigos em medos novos, elas me fazem sentir um nada. Me ensinaram que eu era menos. Menos gente, menos mulher, menos filha, menos querida. Essa foi minha infância e não existe culpa específica para explicar porque a criança que eu fui se sentia assim, é questão coletiva, é expectativa social.

A expectativa matou meus sonhos. Constato isso sem dor, não acredito que uma variável ou outra teria mudado minha história significativamente. Eu aprendi a cada ano que eu merecia pouco, que eu fazia pouco, que eu era pouco. Eu tinha sempre que ser mais, fazer mais, valer mais pra receber reconhecimento. Tentativas nunca contavam como positivas. Desde muito cedo a frustração me acompanha e eu temo continuar ainda um pouco mais lutando pra lidar com cada frustração que ainda vou viver. Eu sei que vou me frustrar muito nessa vida e tenho medo.

O medo é uma força negativa. Paralisante. É a impressão de que as coisas vão dar errado. Que não vou ser forte. Que não vai ser suficiente.

Eu cedi muito da minha vida pra esse sentimento. Tentei evitar me encontrar com ele, me isolei, errei... Errei muito! Errei em nome de um medo que sequer eu sabia nomear.

Medo é paralisante.

Não existe solução (pro meu coração), não tem nenhuma moral no que eu disse. O medo é real, o medo é controlador. Esse texto não tem um final feliz, ele não tem nem final. Os medos persistem, as vezes fortes, as vezes fracos. Tenho aprendido que de nada adianta temer sentir medo, isso o alimenta. Tenho seguido um dia de cada vez, uma coisa de cada vez, mesmo na incerteza tenho caminhado.

Mesmo no erro, mesmo com medo. Minha resistência é minha maior dádiva e viver é revolucionário. Medos podem ser superados.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Irmão

Tenho medo das minhas dores. Coluna, braços, pernas...
Já não são os mesmos, estão exaustos.
O peso que carregam todo dia está drenando a energia do meu corpo.
Meu irmão, que tem 27 anos e pesa mais ou menos 70 quilos, tem que ser carregado pra todo lugar.
Mas não é mimimi de minha parte, não quero que sintam pena de mim. Escrevo porque preciso.

Aos seis meses de gestação do meu irmão minha mãe contraiu rubéola. Uma doença infecto-contagiosa que se cura sozinha mesmo sem tratamento, nada de mais. Seus sintomas são parecidos com os de uma gripe. O problema maior está na infecção quando grávida.
Eu li em algum lugar que nos três primeiros meses ela pode ser transmitida para o feto. Digo que em qualquer estágio de gravidez ela vai ser transmitida para o feto e causar má formação. Meu irmão tem microcefalia congênita, mas não sei precisar mais a condição dele. Já ouvi falarem em hidrocefalia, mas não acho que seja o caso dele.
O que aconteceu é que esse vírus atacou o feto e atrapalhou o desenvolvimento dele. Meu irmão não anda, não fala (na verdade fala sim, mas é uma outra língua exclusiva dele), e precisa de ajuda para tudo. Pra comer, tomar banho, escovar, se limpar, tudo. Eu, mais nova que ele, cresci na realidade dele. Nunca o enxerguei como um doente ou extraordinário. Ele é o meu irmão e o amo. Simples.
Desde que tive forças para o segurar que ajudo nos cuidados diários dele. Carregava ele pra cima e pra baixo já aos 8 anos. Brincava, ria e também brigava com ele. E quando alguém fazia piada ou algum comentário ofensivo eu estava lá pra defender o meu irmão. Já rolei no chão brigando com colegas que falaram que ele era retardado. Em uma festa da escolinha mista que ele frequentava, eu, com meus 4 ou 5 anos, ouvi falarem "olha que dó ele é doente", me contam que eu olhei pro meu irmão e respondi "não é não, olha só, o nariz dele nem tá escorrendo".
Os anos se passaram e a minha postura é a mesma. Meu irmão é um cara fantástico! Hoje um cara barbudo, com cabelos brancos aparecendo, zoador! Quem tem a oportunidade de passar um tempo com ele se apaixona, a diversão dele com minhas amigas é imitar a risada. A Stela até ganhou um "novo nome" na língua dele.
Os anos se passaram, meu irmão. E eu ainda estou aqui pra te defender de qualquer pessoa que venha te taxar como estorvo. Não sou mais a mesma, estou fraca fisicamente mas faço de tudo pra continuar cuidando de você.
Acontece que preciso cuidar de mim também. Eu que nesses anos todos não prestei muita atenção e mim mesma, percebi que não adiantava dedicar minha vida a você se não estivesse bem comigo mesma.
E não estou.
Os seus cuidados diários são constantes. Da hora que você acorda até a hora de dormir, e em alguns dias é preciso fazer uma hora extra. Não posso continuar nesse ritmo.
Quero poder fazer muito por você, mas de formas diferentes. Essa rotina pesada nos leva a trilhar caminhos seguros, até demais. Quanto tempo não saímos pra uma praça, um parque ou praia com você? É um carrega malas, cadeira, carro que impede que a gente se arrisque a passar um tempo produtivo com você por causa de detalhes.
Mano, eu te amo muito, muito mesmo! Minha vida sem você pra dividir o tanto de coisa que a gente divide diariamente vai ser um pouco vazia, mas é preciso. Preciso ter consciência de mim, conquistar minhas metas, meus espaços, pra viver bem e plena e feliz. Tenho certeza que você entende que as minhas faltas não são porque não gosto de você, é por gostar demais que não consigo ser exatamente igual nossa mãe que desistiu da vida toda pra te dar atenção.
Escrevi isso tudo porque nunca falei com você. Não porque eu ache que você não entende, mas porque não sei como vou reagir a tudo. Tenho medos mano, muitos. Assumir assim a minha vida sem ter nada como "desculpa" é uma trabalheira só. Mas tenho certeza que é isso que quero pra mim. E quando você vir que estou bem, tenho certeza que é o que você vai querer também.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

fragmento de criança

um dia eu tive tudo o que queria.
quer dizer, tinha os brinquedos que queria...

não. na verdade eu tinha uma calculadora que era um controle remoto espacial mega utilitário que tinha caído no meu quarto de dentro de um filhote de furacão.

mas o que isso quer dizer é que eu tinha o que eu precisava,
mas eu não queria brincar sozinha.

eu queria desenhar junto.
peguei papel, canetas, lápis e fui chamá-los pra desenhar comigo.

não sei ao certo o que aconteceu, mas eu me lembro brava, jogando tudo no chão e chorando de birra, aí ela disse 'se você tá assim a gente não vai continuar desenhando com você'...

e não continuou.




foi a primeira vez que eu me lembro de ir dormir chorando. e ser ninada nesse choro...

Vem ver

Beringela

     Hoje eu quis falar com você, conversar sem nenhuma restrição sobre tudo o que fosse e é e será. Hoje eu quis muito que a cozinha fosse ...